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Que condições têm os portugueses em teletrabalho?

16 jun 2020

Pretende-se conhecer melhor as condições de trabalho de quem exerce a sua atividade em teletrabalho e os seus potenciais efeitos para a saúde. Os resultados apresentados dizem respeito ao primeiro questionário sobre Teletrabalho e Saúde Ocupacional, do Barómetro Covid-19 da Escola Nacional de Saúde Pública, dirigido apenas a pessoas que se encontravam (ou já se encontraram), nesta fase da pandemia por COVID-19, em teletrabalho.

Os resultados apresentados incluem apenas os questionários considerados válidos, após verificação e controlo. Estes resultados dizem respeito ao primeiro questionário de um estudo que se encontra a decorrer, pelo que devem ser interpretados com o devido cuidado.

 

SITUAÇÃO RELATIVA AO TELETRABALHO

Em relação à situação dos inquiridos face ao teletrabalho: 68,5% (n= 739) já tinha tido essa experiência. Sendo que 93% (n=1049) se encontrava em teletrabalho desde o período do estado de emergência COVID-19 (cerca de 1 mês antes do período de preenchimento do questionário).

Quando questionados sobre se “no regresso à normalidade, gostariam que o teletrabalho fizesse parte da respetiva atividade profissional”, 59% (n=634) gostariam de fazer teletrabalho em tempo parcial; 22% gostaria apenas de ter a opção de teletrabalho esporadicamente; e 9% (n=102) não gostaria que o teletrabalho fosse uma opção.

 

EQUILÍBRIO ENTRE O TELETRABALHO E VIDA PESSOAL

Constata-se que 54% (n= 581) dos inquiridos estão satisfeitos com a sua situação de teletrabalho. No entanto apenas 37% (n=400) se sente satisfeito com o equilíbrio entre o teletrabalho e a vida pessoal. Estes dados podem estar relacionados com a perceção dos inquiridos de que as exigências de trabalho são maiores quando se está em teletrabalho (40%). De facto, 59% (n=661) considera que “trabalha mais horas do que o habitual” e 42% (n=453) considera não ser possível “desligar-se do trabalho” para poder descansar.

No entanto, aproximadamente 70% dos inquiridos considera que tem total autonomia e flexibilidade para que possa decidir como e quando termina o trabalho. 41% “por vezes” estabelece um horário de trabalho. Estes fatores podem ser um contributo para manter a satisfação no trabalho referida anteriormente.

 

AMBIENTE DE TRABALHO E SAÚDE

Apenas 9% dos inquiridos utilizam Computador (torre), monitor, teclado e rato. Nestas situações constatam-se posições de trabalho com (i) a utilização do teclado externo, i.e, para 33% dos inquiridos a altura do seu teclado é diferente da altura do cotovelo e (ii) o topo superior do seu monitor está, relativamente à horizontal, em 47% dos casos acima ou abaixo da altura dos olhos.

Os dados revelam que 46% (n= 495) utilizam computador portátil sem periféricos (monitor, teclado e rato externos). Nessa situação, a utilização do painel de interface (mousepad) é sempre utilizada em 44% dos casos e por longos períodos de tempo, o que não é aconselhado.

Relativamente às posições de trabalho são igualmente fora dos ângulos de conforto no que diz respeito ao teclado (42%). Analogamente para o monitor, 62% dos inquiridos trabalha sentado com o topo do monitor do portátil, relativamente à horizontal, abaixo da altura dos olhos o que poderá ser um fator de desconforto (ou mesmo dor) cervical.

Relativamente ao mobiliário utilizado para trabalhar, 62% (n= 671) dos inquiridos utiliza um equipamento não adequado, nomeadamente cadeira da sala, da sala de jantar, da cozinha ou outra do mobiliário da casa. E apenas a mesma percentagem faz pausas esporádicas e curtas para descansar, ao longo do dia de trabalho.

 

APOIO DA EMPRESA

Os dados revelam que 73% (n=789) dos inquiridos sente que “a empresa confia no seu bom desempenho em teletrabalho”. No entanto, apenas 33% (n=353) dos inquiridos refere que lhe são disponibilizadas “todas as condições e recursos para poder trabalhar a partir de casa, de forma eficaz. Neste contexto destacam-se os seguintes aspetos: (i) formação para desenvolver competências e comportamentos em teletrabalho: 45% (n=481) não recebe qualquer tipo de apoio neste sentido; (ii) equipamentos para o teletrabalho (ex.: computador, monitor, teclado, rato, cadeira, secretária): apenas 489 inquiridos tiveram acesso a um portátil, 2,3% (n=20) a uma cadeira e a 1,5% (n=8) foi disponibilizada uma secretária.

Quando se perguntou aos inquiridos “se pudesse melhorar o seu espaço de trabalho em casa, o que faria?” Cerca de 50% (n= 600) de quem esteve em teletrabalho compraria uma “cadeira e secretária adequadas. A este respeito, quando questionados sobre “a existência de alguém da empresa da área da Saúde e Segurança do Trabalho que desse apoio sobre como adequar o mobiliário e os equipamentos informáticos para estar mais confortável e ser mais produtivo” os dados revelam que 75% (n= 811) dos inquiridos não tem qualquer tipo de apoio. Nos casos onde esse apoio existe, é feito pelo técnico de higiene e segurança do trabalho (70%), pelo médico do trabalho (36%) e em 16% dos casos pelo enfermeiro do trabalho.

Por último, relativamente à comparticipação da empresa na ligação à internet de casa 95% (n=1029) não tem qualquer tipo de comparticipação. A referir que nos casos em que existe comparticipação da empresa (5%) essa ligação não é comparticipada na totalidade, apenas parcialmente em 2,5% dos casos.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise dos dados, em termos gerais, permite-nos fazer algumas considerações:

  • A amostra do estudo não é representativa da população portuguesa, quer em número quer ao nível da caracterização dos inquiridos. No entanto representa uma franja da população que está em teletrabalho e revela um elevado nível de resiliência, i.e., quanto à questão colocada “quando alguma coisa me corre mal (em qualquer área da vida) normalmente preciso de muito tempo para voltar ao normal” 63% (n=674) discordaram dessa afirmação, revelando a capacidade de adaptação e gestão entre vida pessoal e teletrabalho, na situação excecional que caracterizou a fase de recolha de dados – estado de emergência COVID 19.
  • A falta de apoio dado por parte das empresas quer ao nível da saúde e segurança do trabalho, quer ao nível de comparticipação de equipamentos e meios de trabalho, indispensáveis para o desenvolvimento do teletrabalho, é inquestionável.
  • Atendendo a que se perspetiva a possibilidade de teletrabalho não como uma opção esclarecida e voluntária, mas como uma modalidade de trabalho “imposta” exige-se que as estratégias de prevenção dos riscos profissionais e de promoção da saúde e qualidade de vida dos colaboradores sejam repensadas, no sentido de minimizar os efeitos negativos que a falta de apoio poderá causar.
  • As relações de trabalho na modalidade teletrabalho colocam grandes desafios que não se esgotam em dimensões, por exemplo, organizacionais ou jurídicas. Aos aspetos das relações entre o trabalho e a saúde (ou a doença) deve igualmente ser dado grande destaque e a obrigatoriedade da valorização da saúde ocupacional deverá ser ainda mais reforçada.

 

Como síntese final, o teletrabalho em matéria de saúde (e segurança) ocupacionais, tal como a denominada “uberização”, coloca grandes interrogações sobre a melhor forma de proteger a saúde de quem trabalha e reforça a imprescindibilidade de mais e melhor conhecimento das relações entre o trabalho e a saúde por parte de todos.

 

Amostra

O total da amostra são 1082 respondentes dos quais: 75% são do género feminino; 64% estão entre os 30 e os 49 anos; 51% são casados ou em união facto. 48% tem filhos dependentes em casa (entre 1 e 3 filhos). Relativamente às habilitações literárias, 46% dos inquiridos são licenciados, 34% tem o grau de mestrado e 11% o doutoramento.

 

Instrumento

Foi utilizado um questionário online, de preenchimento individual, para aferir: (i) o impacto do teletrabalho no equilíbrio do trabalho a partir de casa e vida pessoal, autonomia, flexibilidade e confiança das chefias com base na E-work life scale (Grant,2018); (ii) o impacto do ambiente de trabalho (equipamentos de trabalho) na saúde dos inquiridose; (iii) o apoio das empresas no desenvolvimento do trabalho.

 

Procedimento

A distribuição do link do questionário foi feita através do método de snowball nas redes sociais (linkedin; facebook; whatsapp) e e-mail, entre os dias 12 de Maio e 3 de Junho de 2020. Prevê-se que o preenchimento do questionário seja realizado em mais dois momentos.

 

 

conheça os resultados “Os Profissionais de Saúde Estão protegidos?”

Questionário 3 | 532 respostas, recolhidas entre 30 abril e 8 maio 2020
Questionário 2 | 6.377 respostas, recolhidas em 2 fases: 2-10 de abril e 16-24 de abril 2020
Questionário 1 | 4.126 respostas, recolhidas entre 2 e 10 de abril 2020