Resultados do Questionário 2: Os riscos para os Profissionais de Saúde vão muito para além do vírus

Os profissionais de saúde são, na atual pandemia, o grupo que apresenta o mais elevado risco de contágio no contexto da pandemia por COVID-19 (risco específico). Trata-se de um grupo de pessoas com contacto próximo com os casos suspeitos e os doentes infetados pelo SARS-CoV-2 (COVID-19) que tem necessariamente de ser protegido pela sua (e a nossa) saúde.

O segundo inquérito por questionário realizado pela Escola Nacional de Saúde Pública (Saúde Ocupacional) no contexto do Barómetro COVID-19 pretende conhecer melhor a atual realidade e avaliar o impacto na saúde desses profissionais indispensáveis, como se referiu, ao “combate” que travamos há várias semanas e que, previsivelmente, continuaremos ainda a travar.

Participaram no 2º questionário, que decorreu entre 16 e 24 de abril de 2020, 2.059 profissionais de saúde. Desses, 48,4% participaram pela primeira vez, totalizando agora os inquiridos 5.180 profissionais de saúde de todas as regiões de Portugal, dos quais quase 2.000 trabalham em serviços com contato direto com casos (ou casos suspeitos) de COVID-19, desde os cuidados intensivos e as enfermarias até aos agrupamentos dos centros de saúde (ACES).

O que se pretende é caracterizar os fatores de risco profissionais a que estão expostos e que não se esgotam no vírus SARS CoV-2, agente da COVID-19. Por exemplo, o contacto com doentes (ou casos suspeitos) de COVID-19 tem repercussões a nível psicológico, constatando-se que quase três quartos dos respondentes apresentam níveis de ansiedade elevados ou muito elevados como resposta às situações de stress que vivenciam. Agora ficou-se ainda a saber que quase 15% (14,6%) tinham níveis de depressão moderados ou elevados. Esses aspetos influenciam por certo a atividade desses profissionais de saúde.

Ainda na área psicossocial, é determinante constatar que quase metade dos profissionais de saúde (44,8%) refere que dorme menos de seis horas diárias o que, associado à sensação de fadiga (que piorou para quase 90% dos profissionais de saúde), pode ter repercussões na sua saúde e, claro, no seu desempenho profissional. De facto, quase quatro em cada cinco profissionais de saúde (78,7%) considera o seu nível de fadiga (física) muito agravado em relação à última semana.

A distribuição profissional apresenta uma maioria de Enfermeiros (39,6%), seguida dos Médicos (26,4%) e dos Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica (18,6%). Participaram, igualmente, Assistentes Operacionais (2,9%) e um conjunto de outros profissionais de saúde como das carreiras Farmacêuticas (laboratoriais e hospitalares), Nutricionistas e Psicólogos, entre outros.

O grupo pertence maioritariamente ao setor público (92,1%) e trabalha em hospitais (48,9%), Agrupamentos de Centros de Saúde – ACES (43,2%), em Cuidados Continuados (1,2%) e em outros locais de prestação de cuidados (6,7%) como as farmácias hospitalares e comunitárias e em laboratórios. Neste 2º questionário, ao contrário do 1º questionário em que o Norte estava representado com quase 40% dos respondentes, a representatividade geográfica assume dominância na região de Lisboa e Vale do Tejo (68,3%), seguido do Norte (14,5%) e do Centro (13,9%) do país.

Em relação aos aspetos de risco microbiológicos, confirma-se o resultado obtido no primeiro questionário, isto é, cerca de um terço (33,4%) dos 5.180 profissionais de saúde não realiza a automonitorizaçao diária, que deveria ser a regra na perspetiva, quer da proteção da saúde do profissional, quer da redução da probabilidade do risco de contágio, tal como preconizado pela orientação da Direção Geral da Saúde desde 21 de março de 2020.

A grande maioria dos profissionais de saúde que participaram no 2º questionário e trabalham em hospitais menciona que o Serviço de Saúde Ocupacional (ou de Saúde e Segurança do Trabalho) gere o risco de contágio para a COVID-19 na sua instituição. Apesar disso, 32,9% (n=658) referem que no local em que trabalham não existe Serviço de Saúde Ocupacional (ou não os apoia). Desses 87,5% trabalham fora dos hospitais e 58% em ACES/Medicina Geral e Familiar. Este valor aumenta quando os resultados dos questionários são agregados e situa-se nos 36,6% (n=1.862), o que representa um substantivo número de profissionais de saúde sem sistema organizado de proteção e vigilância da sua saúde, neste caso do contágio pelo SARS-CoV2 (COVID-19) como risco profissional.

A disponibilidade de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) na última semana, em relação às semanas anteriores, é considerada pelos profissionais de saúde melhor (31,7%) ou mesmo muito melhor (40,7%). A sua disponibilidade aumentou para a maioria na última semana (55,1%), apesar de 11% considerarem que piorou bastante, em particular nos ACES. Na opinião da grande maioria dos respondentes (80,2%) os EPI são adequados.

No que se refere aos efeitos da carga de trabalho sentida pelos profissionais de saúde destaca-se que 30,3% consideram o seu nível de fadiga semelhante ao da semana anterior, enquanto 46,7% apresentaram maiores níveis de fadiga e 10,1% fadiga extrema. A maioria dos respondentes (78,2%) trabalharam menos de 9 horas noturnas (período entre as 22h e as 07h) na passada semana e apenas 9,5% mais de 18 horas. Apesar disso, 44,8% refere ter menos de 6 horas diárias de sono com qualidade. Os resultados do trabalho em período noturno, quando analisados entre os profissionais de saúde que trabalham em área dedicada COVID-19, alteram-se e 19,8% trabalharam entre 9 e 18 horas noturnas durante a semana.

De realçar ainda é o facto de 44,8% dos profissionais de saúde não terem praticado exercício físico na última semana e apenas 2% referirem fazer exercício todos os dias. Tal pode, eventualmente, estar relacionado com o elevado número de alusões à presença de dores musculoesqueléticas (ou desconforto) a nível da coluna vertebral – raquialgias (n=610), que não tinham anteriormente e que podem estar relacionadas, para além das exigências do trabalho, por exemplo com à sobrecarga causada pelos EPI que usam.

Os profissionais de saúde que participaram no 2º questionário e que trabalham em área dedicada aos doentes COVID-19 (n=722), têm como principal local de trabalho os Cuidados de Saúde Primários (34,3%), seguido dos Serviços de Urgência (23%) e das Enfermarias (15,9%). Destes 43,8% são enfermeiros, 26% médicos, 18% técnicos de diagnóstico e terapêutica e apenas 3,7% assistentes operacionais. Na última semana destaca-se que uma parte destes profissionais de saúde (15,1%) trabalharam mais de 12 horas diárias e mais de um terço (34,9%) entre as 8 e as 12 horas diárias.

Foram casos suspeitos de estar infetados em ambos os questionários 13% (n=661) dos respondentes e no 2º questionário apenas 10,3% (n=206). Destes, cerca de metade (49,5%) foram submetidos a vigilância passiva e a larga maioria (98,6%) foi testada para a COVID-19, maioritariamente realizada 72 horas após serem casos suspeitos. Entre os que trabalham em área dedicada à COVID-19 apenas 11,5% foram casos suspeitos e a maioria (56,6%) foram sujeitos a vigilância ativa, o que indicia uma efetiva gestão do risco.

Os testes à COVID-19 foram na maioria (58,3%) realizados em hospitais, apesar de um grande número de profissionais de saúde os ter efetuado em locais privados ou de iniciativa municipal (34,5%). Entre os que estão em área dedicada à COVID-19 (n=722) também 30,1% realizaram o teste fora do hospital.

Dos profissionais de saúde que participaram neste 2º questionário foram positivos, para a COVID-19, cerca de 1,1% e nos dados agrupados dos dois momentos do inquérito cerca de 1,4%.

Oxalá estes resultados do inquérito possam contribuir para uma melhor proteção da saúde dos profissionais de saúde e possam estimular uma ainda maior adesão às respostas que iremos pedir em mais um terceiro (e último) questionário. É que não é possível um bom combate à COVID-19 sem bons (e saudáveis e seguros) combatentes.

 

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Ficha Técnica do Questionário 2 [ PDF ]
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