A par do risco de contrair Covid-19, a ansiedade, horas de sono insuficientes, a fadiga e as dores nas costas têm influência na saúde e no desempenho da atividade dos profissionais de saúde. Estão disponíveis as respostas ao 2º questionário de Saúde Ocupacional do Barómetro Covid-19, que mostram que 36,6% dos profissionais se encontram sem sistema organizado de gestão do risco de COVID-19, isto é a proteção e vigilância da sua saúde nos seus locais de trabalho nestes tempos de pandemia.
Com o objetivo de conhecer melhor a atual realidade e avaliar o impacto na saúde dos profissionais de saúde, o 2º questionário dirigido a profissionais de saúde recolheu, entre os dias 16 e 24 de abril, 2.059 respostas, totalizando agora um universo total de 5.180 questionários respondidos.
As respostas são maioritariamente de profissionais do setor público (92,1%), nomeadamente Enfermeiros (39,6%), Médicos (26,4%), Técnicos de Diagnóstico e Terapêutica (18,6%), Assistentes Operacionais (2,9%), Farmacêuticos laboratoriais e hospitalares, Nutricionistas, Psicólogos, entre outros.
A maioria dos respondentes trabalha em hospitais (48,9%), Agrupamentos de Centros de Saúde – ACES (43,2%), em Cuidados Continuados (1,2%) e em outros locais de prestação de cuidados (6,7%) como as farmácias hospitalares e comunitárias e em laboratórios. Neste 2º questionário, ao contrário do 1º questionário em que o Norte estava representado com quase 40% dos respondentes, a representatividade geográfica assume dominância na região de Lisboa e Vale do Tejo (68,3%), seguido do Norte (14,5%) e do Centro (13,9%) do país.
Ao caracterizar os fatores de risco profissionais a que estão expostos os profissionais de saúde, torna-se claro que estes não se esgotam no vírus SARS CoV-2, agente da COVID-19. O contacto com doentes (ou casos suspeitos) de COVID-19 tem repercussões a nível psicológico, constatando-se que quase três quartos dos respondentes apresentam níveis de ansiedade elevados ou muito elevados como resposta às situações de stress que vivenciam. A análise ao 2º questionário revela também que quase 15% dos respondentes apresentam níveis de depressão moderados ou elevados.
Ainda na área psicossocial, constata-se que quase metade dos profissionais de saúde (44,8%) refere que dorme menos de seis horas diárias. Florentino Serranheira, em nome da equipa de investigadores, explica que “este facto, associado à sensação de fadiga, que piorou para quase 90% dos profissionais de saúde desde o último inquérito, pode ter repercussões na sua saúde e desempenho profissional. De facto, quase quatro em cada cinco profissionais de saúde (78,7%) considera o seu nível de fadiga (física) muito agravado, em relação à semana anterior.
Em relação aos fatores de risco microbiológicos, os resultados continuam a mostrar que cerca de um terço (33,4%) dos 5.180 profissionais de saúde não realiza a automonitorização diária. “A realização da automonitorização diária deveria ser a regra na perspetiva, quer da proteção da saúde do profissional, quer da redução da probabilidade do risco de contágio, tal como preconizado pela orientação da Direção Geral da Saúde desde 21 de março de 2020”, esclarece o investigador.
A grande maioria dos profissionais de saúde que participaram no 2º questionário e trabalham em hospitais menciona que o Serviço de Saúde Ocupacional (ou de Saúde e Segurança do Trabalho) gere o risco de contágio para a COVID-19 na sua instituição. Apesar disso, 32,9% (n=658) referem que no local em que trabalham não existe Serviço de Saúde Ocupacional (ou não os apoia). Desses, 87,5% trabalham fora dos hospitais e 58% em ACES/Medicina Geral e Familiar. “Este valor aumenta quando os resultados dos questionários são agregados e situa-se nos 36,6% (n=1.862), o que representa um substantivo número de profissionais de saúde sem sistema organizado de proteção e vigilância da sua saúde, neste caso do contágio pelo SARS-CoV2 (COVID-19) como risco profissional”, avança Florentino Serranheira.
Quanto aos Equipamentos de Proteção Individual (EPI), a sua disponibilização na última semana, em relação às semanas anteriores, é considerada pelos profissionais de saúde melhor (31,7%) ou mesmo muito melhor (40,7%). A sua disponibilidade aumentou para a maioria na última semana (55,1%), apesar de 11% considerarem que piorou bastante, em particular nos ACES. Na opinião da grande maioria dos respondentes (80,2%) os EPI são adequados.
No que se refere aos efeitos da carga de trabalho sentida pelos profissionais de saúde, 46,7% apresentaram maiores níveis de fadiga relativamente à semana anterior e 10,1% fadiga extrema. A maioria dos respondentes (78,2%) trabalharam menos de 9 horas noturnas (período entre as 22h e as 07h) na passada semana e apenas 9,5% mais de 18 horas. Apesar disso, 44,8% refere ter menos de 6 horas diárias de sono com qualidade. Os resultados do trabalho em período noturno, quando analisados entre os profissionais de saúde que trabalham em área dedicada COVID-19, alteram-se e 19,8% trabalharam entre 9 e 18 horas noturnas durante a semana.
De realçar ainda é o facto de 44,8% dos profissionais de saúde não terem praticado exercício físico na última semana e apenas 2% referirem fazer exercício todos os dias. “Tal pode, eventualmente, estar relacionado com o elevado número de alusões à presença de dores musculoesqueléticas (ou desconforto) a nível da coluna vertebral – raquialgias (n=610), que não tinham anteriormente e que podem estar relacionadas, para além das exigências do trabalho, por exemplo com à sobrecarga causada pelos EPI que usam”, explica o investigador.
Cerca de 15% dos respondentes do segundo questionário que trabalham em áreas dedicadas aos doentes Covid-19 (n=722) trabalharam mais de 12 horas diárias e mais de um terço (34,9%) entre as 8 e as 12 horas diárias. Tratam-se de profissionais maioritariamente dos Cuidados de Saúde Primários (34,3%), seguido dos Serviços de Urgência (23%) e das Enfermarias (15,9%). Destes 43,8% são enfermeiros, 26% médicos, 18% técnicos de diagnóstico e terapêutica e apenas 3,7% assistentes operacionais.
10,3% dos respondentes do segundo questionário foram casos suspeitos de estar infetados. Cerca de metade (49,5%) foram submetidos a vigilância passiva e a larga maioria (98,6%) foi testada para a COVID-19, maioritariamente realizada 72 horas após serem casos suspeitos. Entre os que trabalham em área dedicada à Covid-19 (n=722) apenas 11,5% foram casos suspeitos e a maioria (56,6%) foram sujeitos a vigilância ativa, “o que indicia uma efetiva gestão do risco”, conclui Florentino Serranheira.
Os testes à COVID-19 foram na maioria (58,3%) realizados em hospitais, apesar de um grande número de profissionais de saúde os ter efetuado em locais privados ou de iniciativa municipal (34,5%). Entre os que estão em área dedicada à COVID-19 também 30,1% realizaram o teste fora do hospital.
Dos profissionais de saúde que participaram neste 2º questionário foram positivos para a COVID-19 cerca de 1,1% e nos dados agrupados dos dois momentos do inquérito cerca de 1,4%.
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