Maioritariamente focada na utilização dos cuidados de saúde, a análise do Opinião Social desta semana mostra que, das pessoas que necessitaram de uma consulta e não a tiveram, 22,4% foi porque decidiram não ir e cerca de 35% porque o serviço de saúde a desmarcou. Em tempos de COVID-19, os mais velhos foram os que menos tiveram consultas médicas, os que estão a recorrer menos às urgências e a realizar menos tratamentos em unidades de saúde. Os jovens são quem mais refere ter iniciado a toma de ansiolíticos e antidepressivos durante este período e os idosos quem mais aumentou a dosagem.
Com o passar das semanas, assiste-se a um crescimento do nível de confiança das pessoas no que diz respeito à capacidade de resposta dos serviços de saúde (muito confiante – sem1: 9,4% e sem5: 21,6%).
Opinião Social, o questionário do Barómetro Covid-19 da Escola Nacional de Saúde Pública, que acompanha a evolução das perceções dos portugueses em tempos de pandemia, conta já com mais de 170 mil questionários preenchidos. O estudo vai já na quinta semana de análise e os dados apresentados dizem respeito, na sua maioria, às respostas reportadas entre os dias 10 e 24 de abril.
Quando questionados sobre a necessidade de uma consulta médica durante o período de COVID-19 (n=4991), 75,3% dos respondentes referiu não ter necessitado e 24,7% ter necessitado. Das 1234 pessoas que reportaram ter necessitado de consulta médica, mais de metade (57,6%) não a teve, ou porque os serviços a desmarcaram (35,2%), ou porque o próprio preferiu não ir (22,4%). Os restantes respondentes tiveram a consulta, quer presencialmente (21,2%), quer à distância (21,2%).
Verifica-se que, comparativamente com as mulheres, são os homens que mais reportam não ter tido consulta, apesar da diferença ser ténue. É ainda de referir que 73% dos idosos não tiveram consulta, dos quais 70% foi porque os serviços desmarcaram e 30% por decisão própria.
Esta é uma conclusão importante, uma vez que se trata de um grupo de risco para a COVID-19 e é natural que tenham aderido mais às medidas de confinamento. Não nos podemos é esquecer que é precisamente este grupo quem mais precisa de cuidados de saúde – explica Sónia Dias, coordenadora científica do Opinião Social.
Ao analisar esta questão em função do escalão de rendimento, observa-se um gradiente social em que, tendencialmente, é nos escalões mais baixos que se verificam proporções maiores de pessoas que, tendo necessidade, não tiveram consulta.
Quanto à autoperceção de gravidade do motivo da consulta, os dados revelam de forma muito destacada que são 62% das pessoas que foram presencialmente às consultas quem reporta considerar o motivo grave, comparativamente a 13% dos respondentes que decidiram não ir à consulta e que consideravam igualmente o motivo grave.
Das 186 pessoas que reportaram ter dois ou mais problemas de saúde (morbilidade múltipla) e que necessitaram de consulta, 62% não a tiveram, comparativamente a 53% das que têm apenas um problema de saúde. Numa análise mais aprofundada sobre as pessoas com morbilidade múltipla, 71% das que não tiveram consulta foi por desmarcação por parte dos serviços e 29% foi por iniciativa própria.
São as pessoas que foram presencialmente à consulta quem sente menor risco de desenvolver doença severa ou complicações em caso de contrair COVID-19, quando comparadas com as que decidiram não ir à consulta (43% e 36% reporta risco baixo ou nulo, respetivamente).
Relativamente às consultas médicas que os respondentes realizaram durante este período de COVID-19, as especialidades de Psiquiatria, Reumatologia e Endocrinologia são aquelas que se realizaram mais frequentemente à distância. Por outro lado, as especialidades de Pediatria, Ortopedia e Ginecologia/Obstetrícia são as que mais realizaram consultas de forma presencial. Em relação à não realização de consulta, as especialidades de Oftalmologia, Dermatologia e Otorrinolaringologia são as que apresentaram mais desmarcações, quer tenha sido por iniciativa do próprio ou do serviço de saúde.
Relativamente aos Cuidados de Saúde Primários, 56% das consultas médicas da especialidade de Medicina Geral e Familiar (médico de família) foram realizadas (27% presencialmente e 29% à distância), enquanto 21% foram desmarcadas pelo próprio e 23% pelo serviço.
Quando questionados sobre a necessidade de ir à urgência em tempos de COVID-19, 94,9% refere não ter necessitado e 5,1% ter necessitado. Das 254 pessoas que reportaram ter sentido esta necessidade, mais de um terço decidiu não ir (34%).
São os idosos (45,5%) quem mais reporta não ter ido às urgências, em comparação com as pessoas de idades inferiores (29,8% dos 26-45 anos e 28,9% dos 46-65 anos).
Os dados revelam também que 80% das 166 pessoas que reportaram ter ido às urgências consideravam o motivo grave. No entanto, dos 82 respondentes que decidiram não ir, 31 percecionaram que o motivo era grave. Ainda entre as pessoas que reportaram não ter ido às urgências, os problemas de saúde mais referidos foram doença cardíaca, diabetes e doença respiratória.
Uma leitura mais detalhada dos dados quanto à morbilidade revela que a morbilidade múltipla parece não ter influenciado a ida às urgências, não havendo diferenças entre pessoas com um problema de saúde e pessoas com dois ou mais.
Quando questionadas sobre a necessidade de fazer um tratamento num serviço de saúde em tempos de COVID-19, 93% dos respondentes refere não ter necessitado e 7% ter necessitado. Das 350 pessoas que referiram ter precisado de fazer um tratamento, cerca de 34% não o fez porque o serviço desmarcou e 28% porque o próprio decidiu não fazer. De referir que 37% fê-lo presencialmente.
São mais as mulheres quem reporta não ter feito tratamento (63,7% comparando com 59% dos homens). De entre os que não fizeram tratamento, são mais os homens que não fizeram por decisão própria (34% comparando com 25,8% das mulheres), enquanto que nas mulheres foi mais por desmarcação do serviço (37,9% comparando com 25% dos homens).
Embora com ligeiras diferenças, são também os idosos (67,7%) quem mais reporta não ter feito o tratamento, em comparação com as pessoas mais jovens (59,9% – 26-45 anos; 63,4% – 46-65 anos). Uma análise mais atenta das pessoas que fizeram o tratamento presencialmente revela que cerca de 70% consideraram grave o motivo para o tratamento.
À semelhança do que acontece na utilização das urgências, no que respeita a ter feito tratamento também não existem diferenças entre participantes com e sem morbilidade múltipla.
Relativamente ao consumo de ansiolíticos e antidepressivos durante o período de COVID-19, 83% dos respondentes reporta não ter tomado nenhum destes medicamentos. Das pessoas que referem tomar atualmente este tipo de medicamentos, 14% iniciou a toma durante o período de COVID-19, 9% aumentou a dosagem e 77% não alterou a forma como o faz.
São as mulheres que mais tomam ansiolíticos e antidepressivos (19% comparativamente a 12% dos homens). Quando analisado o consumo por escalão etário, verifica-se que são os idosos quem mais consome (34% dos idosos, 23% – 46-65 anos; 14% – 26-45 anos; 9% – 16-25 anos). De referir ainda que são os mais jovens (16-25 anos) quem mais refere ter iniciado a toma durante este período e os idosos quem mais aumentou a dosagem.
De salientar que, com o passar das semanas, se assiste a um crescimento do nível de confiança das pessoas no que diz respeito à capacidade de resposta dos serviços de saúde à COVID-19. Se na Semana 1 apenas 9,4% das pessoas estava muito confiante, esta percentagem mais do que duplicou na Semana 5 (21,6%). De referir também que, atualmente, apenas 14% das pessoas está pouco ou nada confiante, quando na primeira semana mais de um terço de todos os respondentes reportava estar pouco ou nada confiante.
Consulte os resultados da Semana 5 do Opinião Social.